quinta-feira, 30 de julho de 2015

Ofensiva de marketing de Cartaxo resulta em ofensiva política do PSB

Pesquisas, pesquisas...
Parecem nítidos os movimentos da administração Luciano Cartaxo com o objetivo de criar um clima de favoritismo na eleição do próximo ano.

Durante a semana passada, Cartaxo e seus assessores mais próximos concederam entrevistas numa ação claramente articulada e sincronizada. O prefeito, com ênfase na administração pessoense; Adalberto Fulgêncio, enfocando assuntos políticos, especialmente as relações com o PSB.

O que surpreendeu mesmo foi a ausência de um discurso que começasse a ensaiar a confrontação com o PSB, cuja intenção de lançar candidatura própria no próximo ano não parece ser mais segredo para ninguém.

Tanto o prefeito como Adalberto preferiram continuar alimentando a expectativa de que a aliança entre PT e PSB será mantida. E na trilha dessa ilusão, não se sabe exatamente com base em quê, até mesmo uma chapa com a deputada Estela Bezerra como candidata a vice foi lançada.

Parece que as movimentações iniciadas na semana passada, e que se encerraram com a divulgação de uma pesquisa francamente favorável à administração municipal, entretanto, não apenas deixaram de surtir o efeito desejado de interromper o curso do PSB rumo a assumir abertamente uma postura de oposição, como pare tê-lo acelerado.

Tanto que na última segunda-feira à noite já estava a postos para uma longa entrevista ao programa de TV Conexão Master nada mais nada menos que aquele que é tido como o provável candidato a prefeito pelo PSB, o secretário João Azevedo.

Ontem (quarta), foi a vez de outro secretário, Luís Torres, da Comunicação, aumentar o tom e disparar críticas à gestão de Luciano Cartaxo, bem como estabelecer uma outra perspectiva que certamente desagradou muito Luciano Cartaxo, qual seja, a de que em 2016 haverá “outra pauta” no debate eleitoral. Precisa desenhar?

Tanto que o vereador antiricardista, Bira Pereira, foi escalado por Cartaxo para uma resposta e fez circular imediatamente uma nota em que procura desqualificar Torres, afirmando que o “porta-voz” de RC estaria “com dor de cotovelo” em razão da torrente de obras que a prefeitura toca em João Pessoa, e que resultou nos 70% de aprovação obtidos em pesquisa publicada no último domingo.

Uma pesquisa pouco convincente

Na pesquisa realizada pelo IP4 – que também fez pesquisas para governador, em 2014, aqui na Paraíba – e divulgada pelo Correio da Paraíba no último domingo, a administração do prefeito Luciano Cartaxo é aprovada por 70,3% dos pessoenses, enquanto 21,5% desaprovam.

Além disso, a pesquisa quis saber sobre o conhecimento dos eleitores a respeito das obras em execução pela prefeitura (Lagoa, creches, programa habitacional, UPAs, investimentos em mobilidade urbana, e até a “calçadinha da Orla”).

Nenhuma menção negativa a respeito do trabalho desenvolvido pela prefeitura pessoense dessa pesquisa eu tomei conhecimento. Se existe um paraíso na terra, ele foi criado pelo IP4.

Acho que a turma de Cartaxo exagerou na dose, porque os números são realmente exagerados, especialmente porque há muito ainda por fazer.

Há não ser que Cartaxo pretenda ter números de aprovação semelhantes ao que Lula ou Eduardo Campos conquistaram próximos dos 80%, isso no fim do segundo mandato.

Sendo assim, Cartaxo terá pouca margem de crescimento lá para meados de 2016, quando serão mais decisivos esses números.

Os problemas da pesquisa começam com uma metodologia um tanto, digamos assim, “heterodoxa”. Ao invés dos tradicionais “ótimo, bom, regular positivo, regular negativo, ruim e péssimo”, a pesquisa confrontou o eleitor/a apenas com um “aprova” ou “desaprova.

Isso, claro, depois de perguntar a ele/a respeito das principais obras da prefeitura. Depois de ser lembrado dessa lista, que acaba funcionando como uma clara indução à resposta da pergunta que mais importa: e aí, aprova ou desaprova?

O entrevistado não teve nem a opção de pensar: isso está bem, mas aquilo nem tanto; a Orla está bem, mas os postos de saúde precisam melhorar; as creches parecem uma boa iniciativa, mas o trânsito está um horror.

Parece mesmo que o recurso ao “aprova x desaprova” pretende mesmo é esconder dificuldades num momento-chave para as definições de candidaturas em 2016, especialmente do PSB.

No meio desses 70% de aprovação, quantos são mesmo os que acham a administração ótima ou boa?

Se chegar a 50% nesses itens – eu acho que nem isso, porque 44,5% é o número a que chegou um outro instituto, que não é ligado ao PSB, mas a um “possível” aliado – a situação é dramática para Luciano Cartaxo.

Estamos a um ano do início da campanha, e três anos já é tempo suficiente para mostrar resultado, especialmente para uma administração de "continuidade".

Sejamos concretos: se Cartaxo ostentasse mesmo esses números tão expressivos ele estaria nessa posição que é de quase paralisia diante do acirramento das críticas do PSB?

É pouco provável, mesmo considerando o estilo pouco afeito aos confrontos do prefeito petista, o que não vem a ser um estilo adequando para esses dias de acirramento nacional que vivemos.

Mais ainda num quadro que tende a evoluir cada vez mais para um provável enfrentamento com um candidato apoiado pelo governador Ricardo Coutinho, no próximo ano, que ensejará uma disputa que tende a ser acirradíssima e, portanto, imprevisível.

Diferentemente de 2012, como eu já registrei antes, RC chegará a 2016 com um grande portfólio de obras e ações do governo do estado na Capital, que será acrescido ao trabalho como prefeito. 

Tudo isso impulsionado por uma máquina política e administrativa cada vez mais azeitada. E com um discurso com uma clareza que não deixa margem para titubeios, como já conhecemos do estilo de Ricardo Coutinho.

As palavras que escutei ontem de um socialista não dizem tudo, mas dizem muita coisa: “O problema da administração de Cartaxo não é apenas político. É principalmente administrativo: pouca coisa funciona, e o que funciona não foi ele que fez.” 

No campo de Cartaxo reina a confusão, tanto administrativa quanto política. Há tempo para superá-las, mas esse tempo é cada vez menor.

terça-feira, 21 de julho de 2015

Ciro Gomes põe novamente o dedo na ferida


Ciro Gomes ensaia um retorno à política e não poderia escolher momento melhor do que esse em que o Brasil está imobilizado diante de uma crise sem paralelo na história recente brasileira.

Em seu estilo inconfundível, moldado por um discurso que recusa o floreio habitual tão comum na maioria dos políticos, inclusive nos de esquerda, quando instado a tratar de temas difíceis, Ciro Gomes coloca o dedo nas várias feridas abertas que enfeiam hoje a política nacional.

E o faz com a coragem de quem nunca tangenciou naquilo que, segundo diz, considera ser o fundamento de seu projeto político, que parece se conformar numa associação do projeto de país que vislumbra, há muito já esboçado num pequeno livro que ele escreveu com Mangabeira Unger (O próximo passouma alternativa prática ao neoliberalismo) antes da eleição de 1998, na qual foi candidato, e que tem por base a formação de uma consistente aliança que possa mobilizar os melhores quadros políticos da República.

Na abertura da entrevista que concedeu hoje ao site ConversaAfiada, de Paulo Henrique Amorim – notem que a escolha do veículo também diz muito a respeito do público para quem Ciro Gomes pretende falar,  o ex-governador do Ceará explicou porque resolveu voltar à cena política nacional.

Ciro expôs as razões que deveriam impelir a se manifestar quem dispõe de um mínimo de responsabilidade política nos dias de hoje.

Em primeiro lugar, a percepção de que o Brasil vive uma “escalada golpista” que procura transformar o país, de modo artificial, numa Venezuela.

Essa escalada golpista, que está em pleno andamento, tem variantes e todas elas assumem as feições de um golpe paraguaio, ou seja, dos golpes brancos levados a cabo recentemente na América Latina e que buscam a “legitimidade” por dentro da justiça (TSE) e do parlamento (TCU e Congresso), e cujo desenlace pode colocar em risco as instituições políticas da democracia brasileira duramente conquistadas.

Ciro Gomes, como se espera, não se recusa a apontar que a liderança oculta do golpismo está na “plutocracia”, no “estamento dos endinheirados, especialmente do setor financeiro”, que jamais deram trégua ao governo.

Isso mesmo depois de Dilma ter nomeado um dos seus representantes para o Ministério da Fazenda, o que para ele representa uma loucura da Presidenta, em vários sentidos, seja do ponto de vista político, seja do ponto de vista teórico.

Em segundo lugar, o que Ciro chama de “descaminhos” do segundo governo Dilma, que traiu as expectativas daqueles que, mesmo sem plena satisfação com os resultados do primeiro governo, enxergaram que a candidatura da petista representava a coesão de uma inteligência nacional que foi capaz de identificar ali os valores que importam para o país: a questão nacional, o compromisso moral com a superação das desigualdades e com uma política nacional de desenvolvimento para o Brasil.

Dilma, segundo Ciro, logo após ser eleita, lançou-se numa agenda que é a negação do que a sua candidatura representou, o que acabou por deslegitimar essa agenda que uniu o Brasil em 2014. E isso Dilma certamente fez cultivando uma ilusão de que, ao abraçar-se com “nossos adversários”, eles lhe dariam trégua.

Os problemas de Dilma no governo expressam a ausência de uma visão articulada, homogênea, coerente do ponto de vista político e ideológico, e que resultaram na constituição de um governo sem consistência, a começar pelos petistas que o compuseram no primeiro mandato.

Para Ciro, Dilma não entendeu direito o que fez com que ela se reelegesse. Ao desconsiderar isso, ela abriu o flanco para o golpe e, para evitar continuar jogando água no moinho do reacionarismo, Dilma precisa tomar outro caminho na “gestão da economia, na gestão da política brasileira”.

Ciro deseja, e isso é fundamental, “reconstituir essa legitimidade” perdida, o que significa dizer que ele pretende retomar as bandeiras que uniram o campo vitorioso em 2014 sob sua liderança. Segundo ele, esse campo não pode se recompor mais sob a liderança de Lula, que, para Ciro, será derrotado se abraçar nova candidatura em 2018.

Enfim, Ciro Gomes deu o recado. Um recado de quem percebeu, assim como faz o governador Ricardo Coutinho, o imenso espaço vazio que se abriu na política nacional após as denúncias da Operação Lava Jato e a desorientação política que tomou conta do governo e do PT, que não souberam ainda criar condições para sair da paralisia política que a mídia lhes impôs.

Diante da última pergunta: “Ciro Gomes é candidato em 2018?”, a resposta não poderia ser mais direta: “ Se eu não conseguir me desintoxicar (da vontade que o impele hoje a ser), não. Mas, seu eu achar que é necessário, sim.”

Mais do que a vontade de ser Presidente, que nunca deixou de ter, Ciro Gomes enxerga o campo aberto e uma esquerda órfã de alguém que responda à altura às inquietude e os dilemas atuais da política brasileira.

Lula tem desde hoje um oponente no campo da esquerda.

terça-feira, 14 de julho de 2015

PSB terá candidato; Cartaxo que se cuide


Quem cultivava nos gabinetes da Prefeitura de João Pessoa a esperança de que a aliança PSB-PT seria mantida, perdeu-as durante o último final de semana, quando o presidente nacional do PSB, o pernambucano Carlos Siqueira, incluiu João Pessoa entre as cidades nas quais os socialistas deverão lançar candidatos no próximo ano.

Mais expressiva ainda foi o acréscimo de Siqueira: “Essas já são as pré-candidaturas confirmadas”.

A informação contida na entrevista de Siqueira não foi confirmada, mas também não foi negada aqui na Paraíba. E como em política, em geral, quem cala consente, o silêncio do governador Ricardo Coutinho parece confirmar o que muitos tinham como certo já há algum tempo: o PSB terá mesmo candidato/a em João Pessoa.

E algumas questões parecem já plenamente amadurecidas para que uma decisão como essa se precipite aparentemente antes do tempo. Senão vejamos.

Cartaxo, Cássio e a “disputa nacional”

Luciano Cartaxo permitiu que Ricardo Coutinho liderasse na Paraíba desde que tomou posse do segundo mandato de governador a luta contra os que querem derrubar a presidenta Dilma Rousseff.

Esse movimento da oposição tucana tem na Paraíba um território importante desse embate, já que é paraibana uma das principais lideranças pró-impeachment, Cássio Cunha Lima.

Enquanto RC não perdeu uma oportunidade sequer de confrontar Cássio e o PSDB em razão do que ele chama de “golpe”, afinado com o discurso de Dilma, Lula e das principais lideranças nacionais petistas, Cartaxo mantém um silêncio que certamente constrange petistas e a base social do partido em todo o estado, especialmente em João Pessoa.

Há uma semana, instado a comentar sobre o resultado da última Convenção Nacional do PSDB que decidiu abraçar a proposta de impeachment, Cartaxo fez que não era com ele e deu uma de Conselheiro Acácio: “as críticas fazem parte da disputa política nacional”.

E repetiu o bordão preferido do momento: “Eleição só em 2016”. Tudo pare evitar uma mera crítica a Cássio.

Seria bom que alguém avisasse ao prefeito pessoense que essa não é uma mera disputa “nacional”, e mesmo que fosse ele é uma das figuras “nacionais” do PT, afinal vem a ser o único prefeito petista de uma capital nordestina.

Não é esse modelo de discurso, por exemplo, que adota Fernando Haddad, prefeito de São Paulo, de longe a cidade que certamente abriga o maior contingente de antipetistas do país. Parece ser só uma questão de convicção, compromisso, consistência política.

E coragem.

Esse embate que se desenrola no país atualmente pode resultar no afastamento do governo de uma presidenta eleita pelo povo e empossada há pouco mais de seis meses.

E numa ação que, caso atinja seu objetivo, submeterá os avanços democráticos e institucionais dos últimos 30 anos aos caprichos de um mau perdedor.

Se isso fosse pouco, essa mudança não se resumiria a uma simples mudança de pessoas no governo, mas que resultaria na adoção pelo país de um outro modelo de desenvolvimento. Além das implicações de ordem geopolítica.

Nesse embate, o prefeito petista corre o risco de perder a confiança de boa parte da tradicional militância petista. Pior ainda: a base social pode migrar em peso para o PSB de Ricardo Coutinho.

Mesmo experimentados dirigentes, como o presidente estadual do PT, Charliton Machado, está tão desconfortável com os posicionamentos do prefeito petista que resolveu ser ele mesmo o principal porta-voz do partido no embate direto com Cássio Cunha Lima na Paraíba, criando um imenso óbice para essa aproximação.

Charliton, ao que parece, está só. Nem a tal “esquerda” petista, que dispõe de cargos na prefeitura, faz ecoar as críticas do seu presidente.

Os ataques de Charliton Machado deram certo porque forçaram Cássio a se posicionar. Mas, mesmo reconhecendo as dificuldades conjunturais para uma aliança com Cartaxo em 2016, deixou em aberto o futuro:

“Não vejo no curto prazo a possibilidade de uma aliança com o PT, apesar do respeito que registro pelo prefeito Luciano Cartaxo. Existe hoje um fosso que nos separa pela conjuntura nacional. É realmente algo muito difícil”.

No “curto prazo” (2016), não. Mas, quem sabe no médio prazo (2018)?

Ricardo vai construir seu candidato

O problema de Cartaxo no curto prazo talvez seja porque ele só mira o médio prazo. Cartaxo quer ser candidato a governador, em 2018.

Para isso, ele precisa não apenas se reeleger, mas deixar alguém de sua estrita confiança na cadeira de prefeito de João Pessoa quando precisar renunciar à PMJP.

Eis uma das razões que levam Cartaxo a transferir tudo para 2016: ele quer medir sua força eleitoral para poder decidir se banca uma chapa puro-sangue ou se, para sobreviver, entrega a vice a outro partido.

É claro que RC percebeu a intenção de Cartaxo e decidiu não esperar pela iniciativa do prefeito pessoense.

Coutinho vai construir o espaço do seu candidato para testar suas próprias chances de vitória, o que deve levar ao rompimento definitivo já que as rusgas, que já começaram, tenderão a se aprofundar, porque o espaço que resta ao PSB é o da oposição.

E com um candidato ricardista na oposição, o pesadelo de Luciano Cartaxo – enfrentar um candidato apoiado por Ricardo Coutinho no governo – deve se realizar.

E não será o Ricardo Coutinho desgastado de 2012 que Cartaxo irá enfrentar, mas um governador que planeja cuidadosamente cada passo que dá no seu segundo governo, especialmente em João Pessoa.

Ou seja, o RC de 2016 terá o portfólio da administração que realizou em João Pessoa e que o credenciou a disputar e a vencer o governo do estado em 2010.

Associado a isso, RC é cada vez mais uma liderança estadualizada, mas que precisa manter-se enraizado na capital, sua principal base eleitoral. Como complemento, uma azeitada máquina política e administrativa para contrapor à poderosa máquina que dispõe Luciano Cartaxo.

E uma aliança estadual, que pode juntar num mesmo palanque PSB, PMDB, PDT, PCdoB, PPS, PRB, PR, PTB e Dem.

Na próxima postagem, tratarei de uma questão pouco lembrada, e que passa por 2016, que se relaciona ao projeto de Ricardo Coutinho em 2018.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Lúcio Flávio Vasconcelos​ e a legitimidade do golpe

Print da postagem publica no Facebook de Lúcio Flávio Vasconcelos
Lúcio Flávio Vasconcelos, meu homônimo às avessas e colega de departamento na UFPB, publicou em sua página do Facebook uma defesa do impeachment da presidenta Dilma Rousseff sob o título “A legitimidade do Fora Dilma”. 

Infelizmente, é imperativo reconhecer isso, Lúcio passa a entoar o cântico golpista e a compor o coro aecista da oposição.  

Para justificar sua opção, Lúcio Flávio apela aparentemente para a memória histórica ao lembrar que o PT também defendeu, em momentos distintos, o “Fora Sarney”, o “Fora Collor” e o “Fora FHC”.

Como se trata de um debate político, é bom situar essas posições no seu tempo para evitarmos diversionismos.

Contra Sarney, havia no PT mais retórica do que uma intenção golpista de afastar a qualquer custo o então presidente, tanto que nenhuma ação destinada a propor o impeachment foi levada à frente. Sarney nunca foi ameaçado de ter o seu mandato interrompido.

Contra Collor, é bom lembrar, a adesão do PT se deu tardiamente e aconteceu apenas quando o movimento começava a adquirir apelo político e base de massas.

Isso porque, politicamente, não interessava ao PT o afastamento de Collor já que, caso ele concluísse o mandato, Lula seria favoritíssimo a vencer a eleição seguinte, a de 1994.

Como ficou demonstrado, o impeachment de Collor serviu antes de tudo para promover uma nova composição política. E a reorganização do bloco de poder que se deu em torno da eleição de FHC, cuja unidade levou às reformas promovidas durante o governo tucano.

Lembremos ainda que a proposta de impeachment de Collor partiu das organizações da sociedade civil (OAB, CNBB, ABI, UNE, etc.) e representou uma rara unidade da sociedade brasileira. Eis uma situação em que o impeachment torna-se uma saída política para uma grave crise institucional. Collor perdera a legitimidade como presidente e seu apoio no Congresso se reduzia ao então PFL, hoje DEM, e alguns parlamentares individualmente.

No caso de FHC, a afirmação não é verdadeira. O PT – nem o PCdoB – jamais defendeu o Fora FHC, mesmo que outras organizações políticas, como o MST, tenham empunhado a bandeira.

É importante situar isso porque, com essa posição, o PT demonstrava uma clara intenção de promover as mudanças que seu programa defendia por dentro da institucionalidade, e, para o bem e para o mal, sem as posturas mais à esquerda que orientaram as posições petistas na década de 1980, cujo corolário foi o programa de Lula, em 1989.

Além disso, também representava amadurecimento político e delineava uma preocupação com a consolidação das instituições democráticas no país: o PT temia ser vítima de possíveis maiorias ocasionais que desejassem lhe apear do poder quando o partido a ele chegasse.

E as alianças feitas em 2002 para eleger Lula, que foram ampliadas durante o governo, mais uma vez para o bem e para o mal, representam que o PT conquistou esse objetivo de se tornar “confiável” no exercício do poder.

Em uma outra passagem bastante sugestiva da postagem de Lúcio Flávio, por incorporar esse desprezo da oposição à Dilma pelo aperfeiçoamento das instituições democráticas, num país cuja história republicana até 1985 foi marcada pelo golpismo civil-militar, as circunstâncias são decisivas para que os oposicionistas abracem essa bandeira:

“Inegavelmente o governo Dilma enfrenta a pior crise da era petista. Com uma mistura de desemprego crescente, escalada da inflação, mega corrupção na Petrobras e outros órgãos, e derrotas sucessivas no Congresso Nacional, é legítimo e esperado do jogo democrático que a oposição clame nas ruas: fora Dilma.”

Percebam que essas circunstâncias de dificuldades econômicas e de denúncias de corrupção que resultaram de investigações dos órgãos do Estado – o que deveria ser saudado como um avanço e não servir de justificativa para intenções pouco republicanas , – é o que demonstra o caráter golpista da defesa do impeachment de Dilma.

Notem que até agora nada implicou a presidenta Dilma Rousseff e, portanto, a defesa do afastamento antecede qualquer constatação de seu envolvimento com o que a oposição aponta. 

É uma mera questão de momento, de timing, de circunstância. Enfim, trata-se do velho e conhecido oportunismo político, que é movido inegavelmente pelo desespero de Aécio Neves (e Cássio Cunha Lima, seu fiel escudeiro) de promover novas eleições em breve, já que eles não podem esperar por 2018 pois serão engolidos por Alckmin no PSDB.

Além disso, são fortemente questionáveis os argumentos da oposição tucana para justificar o pedido de impeachment. Seja o depoimento do dono da UTC, que procura corroborar a tese de procuradores de que as doações legais – sim, porque até agora nada do que foi apontado como “propina” apareceu em nenhuma conta particular de qualquer dirigente ou político petista – eram resultado de “propina”. 

A hipocrisia e o cinismo atinge o seu grau mais elevado quando se constata que o mesmo empresário “doou” um valor muito mais alto à campanha de Aécio Neves.

Quanto as tais “pedaladas fiscais” – recursos de bancos públicos que foram usados, entre outras coisas, para pagamento de programas sociais, que foram em seguida devidamente ressarcidos pelo Tesouro, – os tucanos querem que sejam convertidas em crime de responsabilidade uma prática que se tornou usual desde o governo FHC e que foi aprovada pelo TCU até 2013. Por que só agora lembraram dessa “ilegalidade”?

Para terminar, meu caro Lúcio Flávio Vasconcelos, eu sugiro uma releitura a respeito da frase de Montesquieu que você utiliza para abrir sua postagem (“liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem, ou não proíbem.)

A frase nem de longe justifica as opções golpistas de figuras marcadamente republicanas como Aécio Neves, Cássio Cunha Lima, José Agripino Maia, Ronaldo Caiado e Eduardo Cunha. Pelo contrário. Montesquieu está preocupado com o abuso do poder – daí a necessidade de separação dos poderes.

O que vemos acontecer no Brasil, hoje, é o uso de instrumentos do Estado (juízes de várias instâncias, policiais federais, procuradores), com o claro e decisivo apoio da mídia, que esqueceram esse princípio elementar e fundante das sociedades democráticas modernas que é o da equidade jurídica. Sem ela, não pode haver lei para todos; sem ela, não pode haver liberdade plena, a não ser para alguns que estão acima da lei.


É uma pena, meu caro Lúcio, que sua adesão a Cássio tenha se estendido às ideias mais conservadoras que ele hoje abraça.