Filiei-me ao PT há 15 anos atrás, em 1997. Antes, havia
militado no PCdoB, partido no qual entrei ainda adolescente nos estertores da
Ditadura Militar, em 1984, e no qual militei por dez anos, quando me afastei
por divergências na condução do partido. Portanto, minha vida política e partidária
sempre foi na esquerda, quando abracei as causas que sempre considerei as mais
generosas não apenas para o povo brasileiro, mas para a humanidade.
Ainda secundarista, enfrentei os mais ardorosos debates
sobre alianças partidárias. No PCdoB, fui acusado por petistas de traição de
classe por defender a chamada Frente Democrática que elegeu Tancredo Neves no
Colégio Eleitoral, o que pôs fim a 21 anos de Ditadura Militar.
Nessa trajetória pós-ditadura, ainda vi o PT se recusar a
assinar a Constituição de 1988, que muitos iriam defender quando o
neoliberalismo chegou ao poder nos anos 1990; vi ainda muitos petistas se
engalfinharem numa luta interna denunciando outros petistas por defenderem –
vejam só! – uma aliança com os comunistas do PCdoB.
Veio 1989 e o Lula-lá tomou conta do Brasil, apaixonando sua
juventude que abraçou a causa das reformas sociais e econômicas que
representava a candidatura de Lula, amparada numa coligação de esquerda que
envolvia o PT, o PSB e o PCdoB. Só. Desses partidos nasceu uma maiores
movimentos de massa da história brasileira. Milhões de brasileiros foram às
ruas, reproduzindo o que acontecera na campanha pelas Diretas, Já e, depois,
pela eleição de Tancredo Neves. Dessa vez, defendendo um programa de reformas de
esquerda que chamávamos à época de “estruturais” que jamais voltaram a constar
nos programas de Lula.
Paradoxalmente, durante o ano de 1989 e nos seguintes, a
esquerda entraria em crise: queda do Muro de Berlim, fim da URSS, ascensão de
uma nova direita mundial que empunhava a bandeira do neoliberalismo, “globalização”.
Essa intensa mudança, como não poderia ser diferente, provocaria desorientação
política e crise ideológica. Muitos na esquerda deram crédito ao veredito do “Fim
da história” e imaginaram a eternização da sociedade liberal e da hegemonia
americana.
O PT foi um dos partidos que mais foi atingido por essa onda
conservadora, mas ela permitiu que o PT depurar-se e amadurecer sua verdadeira “vocação”
como partido. Da confusão inicial dos primeiros anos da década de 1990, o PT
evoluiu lentamente para um neokeynesianismo de esquerda e, abandonando a
retórica do socialismo, que nunca foi definido até hoje com clareza, o PT
abraçou o “desenvolvimentismo com distribuição de renda”, projeto que,
necessariamente, se ampara na ampliação das bases sociais e políticas da nova
aliança.
Já no PT, eu ainda lembro a cara feia dos remanescentes da
esquerda petista olhando com cara feia para a indicação do grande empresário José
Alencar para a vice de Lula, que durante os oito anos foi mais à esquerda e
mais corajoso ao defender o corte de juros do que os acomodados em seus cargos
membros da “esquerda petistas”, um dos fundamentos do receiturário neoliberal
que Lula manteve intocado até a crise de 2008, quando – Lula é mesmo um homem
de “fortuna”! – abriu-se uma oportunidade histórica para finalmente dar início
à transição para um novo modelo de desenvolvimento, que Dilma Rousseff herdou
como principal tarefa de governo.
Eis uma narrativa que pretende resumir a trajetória do PT e
o sentido dessa organização partidária hoje. O PT continua sendo um partido de
esquerda, tanto no sentido que o termo adquiriu após a Revolução Francesa, de
1789, quanto na imposição estratégica defensiva da crise de fin de siècle, iniciada
depois de 1989, exatos 200 anos depois. Continua de esquerda porque, hoje,
todo “Neokeynesianismo” é de esquerda, orientado por projetos de distribuição
de renda, de controle sobre o capital rentista, e de soberania.
Infelizmente, aqui na Paraíba, alguns petistas entenderam
essas mudanças políticas na trajetória do PT como o fim das fronteiras que
separavam a esquerda da direita e passaram a agir orientados unicamente pelo
pragmatismo político. Desesperados por entrar no jogo do poder, mesmo que fosse
pela porta dos fundos, engalfinharam-se numa luta fraticida em defesa de interesses
externos ao partido, dividindo-o, imobilizando-o, tornando o PT uma caricatura de
partido, desmoralizando sua tradição e sua história.
Jamais compreenderam o que estava em jogo e o que dava
sentido à existência do PT, não por conta de uma disposição ideológica desse ou
daquele dirigente, mas por conta da base social que é o que dá suporte à
existência de qualquer partido. É claro que a Direção Nacional do PT é sempre
mais “permissiva” quando se trata de estados mais “periféricos” como a Paraíba.
É fácil imaginar a resposta de Lula a uma proposta de Paulo Maluf para uma
troca de apoio em cidades importantes de São Paulo. Mas, o PT da Paraíba também
tem história e é de origem primordialmente urbana.
Ao invés de, na Paraíba, afirmarem um projeto e uma aliança de
centro-esquerda, como, aliás, acontece em todo o Nordeste, se jogam nos braços
do PP, um partido mais que conservador, de direita, um legítimo representante
do latifúndio e do agronegócio. Participar com o PP de alianças políticas é uma
coisa. Outra é tê-lo encabeçando-as.
E para não me taxarem de “esquerdista”, digo logo que as
alianças na Paraíba devem comportar os partidos mais ao centro, se possível
confluindo para o PT como partido aglutinador, como aconteceu com o PSB, só que,
nesse caso, com adversários nacionais do governo Lula, o que tornou
impraticável uma aliança em 2010, mesmo considerando ser um PSB um partido do “núcleo
duro” da aliança nacional lulista.
Essa é uma carta que representa uma desistência, uma
derrota, uma descrença com os destinos do PT na Paraíba. Desfilio-me do PT
depois de 15 anos de filiado, quando acompanhei derrotas e, finalmente, pude viver
a alegria que foi eleger Lula em 2002. E, com todos os percalços e limitações
de uma base tão ampla quanto necessária para sustentar um governo sob o fogo
cerrado da grande imprensa e das elites econômicas. Percebi no decorrer dos
últimos 10 anos o amadurecimento do projeto em andamento, que se encaminha para
alcançar, com a lentidão com que sempre são feitas as mudanças no Brasil,
sempre graduais como Lula percebeu desde cedo, os objetivos de um desenvolvimento
econômico e social ancorado num projeto de nação.
Eis o desafio histórico que a atual direção do PT da Paraíba
jamais levará em consideração. Saio do PT, mas permaneço um ardoroso apoiador desse
projeto.
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