Os resultados do primeiro turno na Paraíba confirmaram as
expectativas de mais uma disputa acirrada entre os dois principais candidatos
ao governo, o que se repete no estado desde 2002.
Quem achou que Cássio Cunha Lima teria uma vitória
tranquila, já no primeiro turno, enganou-se redondamente.
Em março, eu registrei aqui mesmo:
“os números de Cássio (40.8%) aferidos
em um momento tão favorável devem acender o sinal de alerta entre os tucanos.
Cássio não está com essa bola toda, como se imaginava” (clique aqui para
conferir).
Cássio acabara de anunciar o rompimento com RC e fez desse ato
um espetáculo político, associado a uma competente movimentação política nos três
anos em que permaneceu dubiamente apoiado o governo.
A obtenção de um percentual pouco maior que 40% era um
indicativo que não havia muito espaço para o tucano crescer, e o motivo era
que, se havia um eleitorado muito fiel a Cássio, havia também um grande
contingente que o rejeitava.
E durante a campanha, foi ficando cada vez mais claro que
havia um teto para o crescimento de Cássio que, no seu melhor desempenho,
chegara a 47% em pesquisa divulgada em primeiro de setembro pelo IBOPE. RC já
atingia 33%.
Nesse mesmo dia, eu registrei (clique aqui) sobre esse resultado:
“O recomendável é esperar um pouco mais. Uma diferença de 14
pontos pode tranquilamente ser retirada em um mês de campanha. A questão a ser
respondida é se o eleitor de Cássio estará aberto a mudar de voto. É essa a
questão chave.”
Pelo jeito, considerando o acerto da pesquisa, foi isso que aconteceu. Cássio
perdeu votos ao longo do mês sob pesado bombardeio da campanha de mídia do
governador e, 19 dias depois, a diferença, que era de 14 pontos, segundo o
IBOPE, caíra para apenas 5%.
Na manhã do dia 19, portanto, antes da divulgação dos números da
pesquisa IBOPE, que só foi concluída e divulgada à noite, eu voltei a analisar
o quadro eleitoral da Paraíba um texto intitulado Segundo turno à vista (clique aqui):
“A duas semanas da eleição, tudo indica que a
velha divisão no eleitorado que marcou a Paraíba nas três últimas eleições está
prestes a se repetir.”
“A mais de dois meses estacionado entre os
44%-47%, Cássio não conseguiu abrir uma vantagem que lhe desse a segurança de
que não seria alcançado até o dia da eleição e venceria no primeiro turno.”
“Por outro lado, a julgar pelos resultados das
últimas pesquisas, quando o eleitorado começa realmente a se definir, que
mostram crescimento consistente da candidatura de Ricardo Coutinho e apontam
para uma irredutível queda da diferença entre os dois principais candidatos e a
realização do segundo turno.”
As pesquisas do IBOPE e da 6Sigma conseguiram captar o
acirramento da disputa e cravaram empate técnico às vésperas da eleição, números
que foram confirmados nas urnas.
João
Pessoa quebra votação de RC
Apesar das vitórias expressivas, RC e Cássio tinham expectativas
de maiores votações naqueles que são suas principais bases eleitorais. Em João
Pessoa, RC emplacou uma diferença superior aos 76 mil votos: Ricardo Coutinho 212.230
ou 56% - Cássio 135.977 ou 35,9%.
Se comparamos com o desempenho de 2010, quando RC enfrentou José
Maranhão, o governador reduziu sua votação quatro anos depois em 1.581 votos, quando
obteve 213.811, o que significa que, em 2014, com um eleitorado maior e com o
apoio das máquinas estadual e municipal, ele não conseguiu sequer repetir o
desempenho de 2010, quando só tinha a Prefeitura lhe apoiando.
É bom lembrar que João Pessoa sempre um eleitorado
majoritariamente hostil a Cássio e aos Cunha Lima. Em 2002, Cássio obteve 30%
dos votos no primeiro turno, mas contava com o apoio do então prefeito, Cícero
Lucena. Em 2006, chegou aos 39,2%, mas
estava no governo.
Em 2014, Cássio obteve quase 36% dos votos sem contar com
máquina alguma, e ainda faltando-lhe o apoio de Cícero Lucena, decisivo nas
votações anteriores obtidas por Cássio na Capital.
Se o tucano, entretanto, não teve o apoio político e
administrativo de antes, dessa vez sobrou o envolvimento militante de vários
sindicatos de servidores, que fizeram uma campanha sistemática contra o atual
governador. Esse, sem dúvida, foi um apoio que acresceu preciosos percentuais de
votos ao espólio cassista em João Pessoa.
Campina
quebra votação de Cássio
O mesmo pode ser dito em relação à Campina Grande e o
desempenho de Cássio. Se, em termos percentuais, a diferença pró-Cássio foi 10%
maior na cidade, chegando a quase 30 pontos percentuais (59,8% a 29,9%), numericamente
essa diferença acabou sendo menor: 63.854 votos (127.701 a 63.847), o que permitiu,
comparando o desempenho dos dois em João Pessoa e Campina, uma diferença pró-RC
em torno de 12 mil votos.
Comparando com 2010, Ricardo, apoiado por Cássio, obteve 130.157
votos (64,22%), ou 2.456. Veja que, em 2010, Cássio conseguiu mais votos para
RC em sua cidadela eleitoral do que para si próprio, agora em 2014. Isso mesmo
com o apoio da Prefeitura campinense, que ele não teve quatro anos atrás.
Em Campina, não há como negar o desempenho surpreendente de
RC no município que, no início da campanha, poderia ser o seu Calcanhar de Aquiles.
O que parece ter ocorrido é que, diante da polarização real
que se estabeleceu na campanha, o eleitor que tradicionalmente vota contra os
candidatos da família Cunha Lima optou por RC.
Mas, só isso não explica, porque a soma dos votos de RC com os
de Vital do Rego (8,3%) e todos os outros candidatos em Campina ultrapassam os
40%!
O que pode ser explicado pelo desempenho sofrível da administração
do prefeito da Rainha da Borborema, Romero Rodrigues, tucano e primo de Cássio.
Das 10
maiores cidades RC venceu em 7. Nas 20 maiores, o governador venceu com mais de
30 mil votos de frente
Um aspecto que eu venho chamando a atenção desde 2009 diz
respeito à mudança no perfil do eleitorado nordestino e de suas lideranças,
cada vez mais urbanas e de classe média.
A visibilidade dessas mudanças foi potencializada depois que
Lula chegou ao governo e, no Nordeste, viabilizou a ascensão de muitas
lideranças de esquerda aos governos nordestinos.
Da Bahia, até 2006 tradicional base do carlismo, ao
Maranhão, dos Sarney, a mais longeva oligarquia que ontem foi derrotada por
Flávio Dino, do PCdoB, nenhum governo estadual desde então deixou de ser
ocupado por lideranças com vínculos com a esquerda e cuja origem social é
oriunda de grandes centros urbanos. Muitos começaram sua carreira política como
sindicalistas.
A Paraíba foi o estado onde essa mudança mais demorou
chegar, mas em 2010 ela finalmente aconteceu com a eleição de Ricardo Coutinho.
Pois bem. Quem observar atentamente o quadro eleitoral de
2014 verá que a tendência que se observou em 2010 foi aprofundada. Há quatro
anos, RC surpreendeu a Paraíba ao vencer nas principais cidades do estado que
seguem a linha da BR-230.
Em 2014, RC consolidou sua votação nessas cidades e, em
alguns casos, até ampliou. Em 2010, na Região Metropolitana de João Pessoa (RMJP),
RC foi derrotado em Santa Rita e Cabedelo.
Em 2014, venceu em todas as cidades
da RMJP. Além disso, venceu em Patos, Sousa e Cajazeiras, a tríade mais
populosa do sertão, além de Monteiro, Princesa Isabel e São Bento.
Nas 10 maiores cidades paraibanas, RC obteve 439.745, o que
representa 47% de toda sua votação, tendo vencido em sete delas e obtido uma
diferença sobre seu principal adversário de 57.600 votos.
Quando consideramos as 20 maiores cidades, que sozinhas
representam 50% do eleitorado paraibano, RC continua vencendo Cássio, mas a
diferença cai agora para 31.438 votos.
E quanto mais a votação adentra os municípios menores, essa
diferença diminui até Cássio ultrapassar RC e estabelecer uma diferença final
de 28.388 votos.
Enfim, à candidatura de Cássio foi ao longo da campanha
sendo empurrada para os pequenos municípios onde a influência dos prefeitos é
maior sobre o eleitorado, o que fragiliza aos poucos a força política de uma liderança
que se assenta nessas bases.
2014, nesse aspecto, se distingue das três últimas eleições onde
o peso dos governadores candidatos à reeleição (Roberto Paulino, em 2002, o
próprio Cássio, em 2006, e José Maranhão, em 2010) nos municípios de até 10 mil
eleitores sempre ficou acima da média obtida nos maiores municípios. (Veja os
dois quadros abaixo com as votações de 2002 e 2006 distribuídas entre grupos de
municípios).
Enfim, nada indica que o segundo turno de 2014 será
diferente tanto do que observamos no primeiro, quanto nas três eleições, todas
decididas por margens mínimas de votos.
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