Lula venceu todas as adversidades em sua vida, da pobreza ao câncer. E está diante de um novo desafio |
O PT deve conviver hoje com uma incômoda dúvida: a
Presidenta Dilma Rousseff é a melhor candidata para dar continuidade ao projeto
de governo iniciado há 10 anos por Lula? Dessa dúvida, um inevitável dilema surge:
Lula deve voltar ou manter-se afastado da disputa presidencial?
Essa questão veio à tona depois que as grandes manifestações
populares e estudantis foram às ruas para expor o descontentamento, de cima a
baixo, com as instituições do país, e acabaram por colocar em xeque práticas amplamente
disseminadas na política brasileira, que lideranças e partidos, confortavelmente acomodados, teimavam em não
reconhecer.
Num rasgo do senilidade política, presidentes de poderes e ministros do PMDB sequer esperaram a
poeira baixar para se meterem em viagens com familiares à bordo de aviões da
FAB para cumprirem suas “agendas” pelo país afora, de jogo de futebol a casamentos de compadres. A
acomodação política dos últimos anos parece ter turvado a percepção da realidade de alguns políticos do PMDB, espero que não de todos.
Se essas manifestações ajudarão a mudar alguma coisa, só o
tempo dirá. E, não esqueçamos, o tempo é o ingrediente principal para manter a velha tradição das eleites brasileiras de “mudar para deixar tudo como está”. Acossados pelas manifestações
e pela proposta de realização de uma Constituinte, a velha política, com a
ajuda sempre disponível da grande imprensa e dos "juristas" de plantão, cuidaram logo de afastar o perigo.
Constituinte, não! E Dilma recuou muito cedo, sem assegurar que pelo menos que o
plebiscito fosse realizado.
Pouco mais de uma semana depois, o PMDB e os outros partidos
da “base” já seguram o caixão do plebiscito, ansiosos para enterrá-lo
definitivamente. Tudo que cheire à participação popular remete a perigo. O que
eles querem é fazer voltar a velha acomodação política para a qual o PT também
foi arrastado, isolado pelo conservadorismo.
A volta
de Lula: razões políticas
É para tirar o PT desse círculo de fogo que Lula deve voltar
a emprestar sua liderança. Trata-se de renovar e reorganizar o projeto
político, acenando com novos compromissos e novos desafios. A atual aliança
política já deu o que tinha que dar: viabilizou a sobrevivência das armadilhas
dos primeiros anos de governo para dar início, em seguida, à gestação de um
novo modelo de desenvolvimento.
O desafio hoje é ir além. O que só pode ser feito se o PT
deixar de ser refém do PMDB, da grande imprensa e de setores da classe média, e construir uma nova aliança nacional a partir de
um projeto mais claro de país. Enfim, na conjuntura aberta depois da crise
internacional de 2008-2009 e, mais recentemente, após as manifestações que
expuseram a velha fratura entre um país rico (a 5ª maior economia do mundo) e a
pobreza do seu desenvolvimento, o projeto mais do que nunca é consolidar – para não assustar os
desinformados ou avessos à mudanças mais “radicais” – um programa neokeynesiano,
que ajuste aos desafios sociais e econômicos atuais às necessidades históricas
brasileiras que, imagino, sempre foi a “vocação” histórica do PT.
Sem dar respostas concretas a essas questões, restará o
apelo para manter tudo do jeito que está, mesmo com os (grandes) avanços
verificados. A questão é saber se os desafios da sociedade de hoje são os mesmos
de dez anos atrás. Com a maior parte da classe média, isso está cada vez mais
cristalino, o PT não conta mais. Ela mostrou ser o que sempre foi no Brasil: conservadora
e resistente às mudanças, traços que ela procura esconder por trás de um velho falso-moralismo
político.
Acenar para esses setores é o mesmo que acenar para uma paisagem
sombria. Por mais que existam, eles serão incapazes de reconhecer alguma
qualidade política na esquerda. E só seremos capazes de enxergar neles maus
augúrios contra os pobres e contra a democracia. E, sem a maior parte da classe média, resta o apelo ao povo.
Mas, Dilma é o melhor nome para isso?
A volta
de Lula: razões eleitorais
A “gerente” Dilma Rousseff submergiu à política e nem com a imagem de "técnica" que ela cultiva desde a campanha de 2010 ela foi capaz de consolidar. No governo, ela só conta hoje
com os cargos para manter a docilidade do PMDB, sempre a dar uma no cravo e outra
na ferradura.
E quanto mais setembro de 2014 se aproxima, mais o preço da
fatura aumentará, e Dilma estará enredada com o que o povo mais deplora hoje em
casa ou nas ruas. E sem o PMDB, Dilma dificilmente se reelege. Além disso, é bom
lembrar, que mesmo que recupere a aprovação ao seu governo, o que provavelmente
vai acontecer, isso não significa intenção de voto. Em 2010, Lula tinha mais de
80% de aprovação e mesmo assim tivemos segundo turno. E num segundo turno contra Marina Silva, as chances de derrota são imensas.
Eis um dilema difícil de ser superado, a não lançando um
outro candidato com um vice de outro partido. No PT, nas circunstâncias atuais não
há outro candidato em condições de vitória a não ser Luís Inácio Lula da Silva.
Lula é um homem de sorte. E sorte, como eu já defini, são as circunstâncias conspirando em seu favor. Durante o seu governo, Lula enfrentou as maiores crises
sempre a tempo de revertê-las.
A do “mensalão”, em 2005, ajudou Lula a dar uma virada no seu
governo, começando a gestar ali o início o novo modelo econômico para diferenciar-se
do PSDB. Com a crise de 2008-2009, no final do segundo governo, abriu-se uma dupla oportunidade: o Brasil
passaria pela maior crise do capitalismo depois de 1929 sem grandes
sobressaltos – sintoma de consistência do modelo em gestação – o que deu razão a
Lula para justificar e aprofundar a direção desenvolvimentista do seu governo, desmoralizando
seus tradicionais críticos econômicos na imprensa, a repetirem ad nauseam as velhas receitas que
ajudaram a quebrar várias vezes o Brasil, mas não os bancos que eles
representam.
Lula está diante de uma nova oportunidade. Voltar à cena
política como candidato para completar o ciclo por ele iniciado e consolidar o
modelo de desenvolvimento econômico e social, talvez a mais original experiência depois
de ascensão e queda do neoliberalismo na América Latina, esse fantasma que teima em reconhecer
que não morreu e continua a nos assombrar falando, entre outros, pela boca tenebrosa de Miriam Leitão. Oferecer
ao Brasil a força de sua imagem quase mítica a serviço da mobilização social em
busca de mudar, de verdade, o Brasil, e rememorar o velho Lula e o velho PT,
restabelecendo o encontro com as ruas, é o que se esperar que Lula faça.
Que Lula não se engane: é a ele que o conservadorismo e a
mídia pretendem derrotar em 2014. Foi contra ele que tentaram dirigir as
energias contestadoras das manifestações. É Lula que pretendem desmoralizar e destruir
sua herança, para que nada reste a não ser uma memória trágica e corrupta para
as futuras gerações. Enfim, ninguém melhor do que Lula para defender o seu
legado, a ser renovado em um novo governo, com novas energias.
A candidatura de Lula, além de mobilizar com mais paixão os
mais pobres para preservar o que já foi conquistado e avançar em novos
compromissos, teria o condão de neutralizar a candidatura de Eduardo Campos,
abrindo com isso a possibilidade de um novo vice que ajude a tirar o PMDB de
cena, unindo o PSB, hoje dividido, e restituindo-o ao seu bloco histórico.
Além
disso, Marina Silva perderia parte do apelo que sua candidatura pode
representar para os mais pobres por conta de sua origem. E com ela, por que não pensar numa recomposição? Uma vice ideal?
Essa é uma decisão para a qual o PT e Lula não dispõem de
muito tempo para tomarem. A aposta na manutenção da candidatura de Dilma é legítima, mas
será uma aposta. 2010 mostrou até onde a oposição pode ir. Agora, temos a enriquecer
o exemplo de 2013.
Lula, por outro lado, não é uma aposta. A não ser que haja
um tsunami econômico, é quase certeza de vitória.
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