Manifestação de ontem: as bandeiras vermelhas estão de volta às ruas? |
Diferente das últimas manifestações que ocorreram no Brasil
durante a realização da Copa das Confederações, que se caracterizaram pela
ausência de foco nas suas reivindicações, muito por conta da ausência de
organização política e de liderança, as de ontem, dirigidas pelas Centrais
Sindicais, deram um sentido muito mais preciso à luta pela melhoria nas
condições de vida da população, especialmente a mais pobre.
As bandeiras do movimento, entre elas Redução da Jornada de
Trabalho, 10% do PIB para a Educação, 10% do Orçamento da União para a Saúde e
Reforma Agrária, representam uma inédita unidade entre correntes políticas e
sindicais, que se sentiram alijadas das manifestações de junho pelo sentimento
antisindical e antipartido que acabou predominando. De sua elaboração
participaram desde a CUT, majoritariamente dominada por petistas, até a
Conlutas, que abriga os militantes do PSTU.
Fim da
letargia sindical?
O sucesso das manifestações de ontem pode representar o fim
da letargia dessas organizações, que desde 2003 não saiam às ruas para protestar.
A CUT principalmente. A central na qual atuam os petistas, apesar do esforço de
se diferenciar do governo, foi incapaz de tomar a iniciativa política e
mobilizar as ruas em defesa de suas bandeiras históricas, o que permitiu uma
clara acomodação do PT no governo.
Esse imobilismo da CUT não pode ser atribuído apenas às
relações políticas de proximidade com o governo, mas também a um refluxo geral caracteriza
o sindicalismo no mundo inteiro. Mas, há um ingrediente político que deve ser
acrescentado: as insatisfações crescentes cada vez mais explícitas do
sindicalismo petista com Dilma Rousseff, e essas manifestações podem esgarçar
mais ainda as relações dos sindicatos petistas com a presidenta. E não se pode
desconsiderar o fato de que é cada vez mais forte os movimentos no interior do
partido governista para trazer Lula de volta à cena política. Não se enganem:
quanto mais Dilma se desgasta, mais essa possibilidade se fortalece. Anteontem,
um grupo de prefeitos, num rasgo de ousadia, vaiou a Presidenta da República. E
a cada vaia, a cada protesto contra Dilma, a candidatura de Lula se fortalece
no PT e na sociedade.
As
novas manifestações e o governo
Se as manifestações de ontem, que percorreram todo o país,
vão marcar uma nova fase na ação sindical, dependerá da disposição política da
população e do seu atual espírito contestador, que parece ainda aceso. Se isso
realmente acontecer, a política brasileira também deve entrar numa nova fase,
marcada por uma maior polarização social, a exemplo do que ocorre em outros
países da América Latina, como na Argentina. Os médicos começam a acender esse
pavio. E o motivo é que será de difícil compatibilização as pressões das
reinvindicações históricas desses movimentos com a coalizão liderada hoje pelo
PT, que tem a hegemonia, pelo menos no interior do Congresso, dos partidos mais
à direita do espectro político nacional.
Essas diferenças entre o PT e esses partidos, a exemplo do
PMDB, que eram apenas latentes em razão da necessidade de convivência para
governar o país, começaram e se expor no decorrer das manifestações de junho.
Elas começaram a balançar essa aliança. Foi quando Dilma Rousseff, procurando
sair do imobilismo a que estava submetido o seu governo e para dar respostas às
insatisfações das ruas, anunciou algumas medidas e forçou o Congresso a apreciar
outras, que dormiam esplendidamente em suas prateleiras, para onde são enviadas
sempre que interesses contrariados predominam.
Enterram
o plebiscito
Como o pior político é aquele que não quer ver, ou só
enxerga até a distância do próprio umbigo, não esperaram nem esfriar o corpo da
proposta de Constituinte, que já nasceu prematura e, por isso mesmo, frágil,
morrendo logo em seguida, o Congresso cuidou essa semana de enterrar sem muita
cerimônia a proposta do plebiscito. Nisso, parte da situação (PMDB à frente) e
toda a oposição se irmanaram num só discurso: “o plebiscito é caro!” (só ele?),
“não há tempo para realiza-lo!”. E deixaram Dilma e o PT falando sozinhos. Pelo
menos eles poderão isentar-se da culpa pela exclusão do povo de participar de
algo que lhe diz respeito em um momento de crise política como o atual. O PMDB
e o PSDB assumirão a culpa sozinhos.
E
Pâmela Bório foi às ruas?
Manifestação terminou no Palácio |
Ontem, o Presidente do Sindifisco, Vitor Hugo Nascimento,
sentiu falta de uma ilustre apoiadora das manifestações de rua no Brasil: a
primeira-dama da Paraíba, Pâmela Bório. Bório publicou em uma das redes sociais
frase de apoio a uma das manifestações que aconteceram em João Pessoa durante o
mês de junho: “Hoje é dia! Não vamos parar”, incentivou a Primeira-Dama da
Paraíba, crente que as manifestações nada tinham a ver com o seu marido, o
governador paraibano, ou com seus próprios luxos de primeira-dama que ela faz
questão de publicizar. Esse é o problema de se enxergar a vida através de um
computador ou de um smartphone. Pior ainda é achar que o mundo se resume a
isso.
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