sábado, 26 de setembro de 2009

A pedagogia política do caso Cícero, o "irretirável"

Escrevi ao jornalista Rubens Nóbrega, que mais uma vez, generosamente, publicou em sua coluna diária no Correio da Paraíba o texto que segue abaixo. Trata-se de uma breve análise dos fatores que sustentam a candidatura de Cícero Lucena ao Governo da Paraíba, apesar de todo esforço do ex-governador Cássio Cunha Lima de esvaziá-la. Cunha Lima e os cassistas tem cobrado insistentemente de Lucena respeito à vontade da maioria do grupo, mas demonstra a cada dia que não é com o "grupo" que o ex-governador está preocupado, mas exclusivamente com o destino pessoal e de sua família.

Não há razão - nem local nem nacional - para Cícero Lucena desistir de sua candidatura, especialmente para apoiar alguém que o hostiliza e é por ele hostilizado. Além de tudo, existe o arranjo nacional e os interesses partidários mais amplos, esses sim, de partido, associados ao projeto nacional do PSDB e que Cunha Lima deseja subordiná-los na Paraíba aos seus interesses particulares e familiares.

Mais do que qualquer coisa, esses acontecimentos envolvendo as disputas dentro do PSDB em torno da candidatura ao Governo do Estado estão sendo de uma pedagogia insofismável. Especialmente para o entendimento dos limites da solidariedade política de uma liderança como Cássio Cunha Lima, cuja maior responsabilidade seria procurar manter, a todo custo, e para melhor dirigi-lo, a unidade do seu partido, e não apenas do seu grupo, que, aliás, Cícero Lucena sempre fez parte. Rompendo com essa responsabilidade, e diante de uma derrota iminente, Cássio Cunha Lima está ameaçado de ficar só, pois depois não poderá cobrar de ninguém o apoio que não deu em um grave momento de dificuldade, como o que Lucena vive agora.

Ricaro Coutinho, infelizmente, é outro que abandona uma trajetória política que, em verdade, foi, mais do que a sua obra adminstrativa, a responsável pela ocupação de um espaço que, desde a morte de Antônio Mariz, estava vazio e carente de novas lideranças. Nunca é bom esquecer que Coutinho, mesmo sem nenhuma experiência administrativa, obteve mais de 72 % dos votos de João Pessoa, em 2004. E isso ele construiu com muito esforço e quase sozinho, o que o torna uma figura ímpar na política paraibana.

Mais do que praças, ruas, escolas e creches, Coutinho representava esperança; mais do que novidade, essa expressão quase fetichista que, como tudo desprovido de conteúdo, não significa nada, Coutinho, com seu ardor abnegado e quase desprendido de fazer política, representava a mudança em direção a novas formas desse fazer político. Com esse capital ele conseguiu eleger-se e reeleger-se prefeito de João Pessoa e sua candidatura ao Governo da Paraíba, hoje, não é apenas legítima, não é apenas um passo, digamos, natural na ascensão vitoriosa de quem abraçou a política como vocação, não é, por fim, um passo rumo à estadualização de sua liderança, inquestionável, hoje, mas a consolidação de uma trajetória que só a generosidade das pessoas mais simples e distante do jogo político conseguem oferecer como homenagem a um político.

Quem achar que, na próxima ou em qualquer futura eleição, os eleitores vão desconsiderar as companhias políticas, moldadas em alianças que, inevitavelmente, resultarão em compromissos políticos e administrativos, para só ver o "administrador", o "gerente" - essas expressões despolitizadas criadas com o objetivo de diminuir o peso da política nas decisões da administração pública, como se ela fosse uma empresa, resultando numa tecnificação da política e, portanto, na "morte" do político, pois basta o gerente, - quem achar isso, desconsidera não só a história, mas importância da política na vida das pessoas.

Muitos são os exemplos, mas fiquemos com um só. Wilson Braga, em 1990, foi candidato a governador depois de ter administrado João Pessoa, de onde saiu como o 2º prefeito mais bem avaliado do país. Braga, há um ano da eleição, era considerado imbatível. No final, ele não só foi derrotado por Ronaldo Cunha Lima, como perdeu a eleição no segundo turno na Grande João Pessoa. O que aconteceu? O que derrotou Wilson Braga? A poesia de Ronaldo Cunha Lima? Quem derrotou Braga foi a política, foi o debate que cada cidadão realizou em cada esquina, em cada mesa de bar, em cada refeição com a família. E a administração de Wilson Braga? Foi engolida pelo que ele representava em termos políticos e pela conjunção de partidos e forças que representava o atraso e que se reuniu em torno dele.

Os tempos são outros, claro. Os personagens também. Mas, o que há de permanente na política é a própria política. Ricardo talvez aprenda isso, da pior maneira possível.

Abaixo, a coluna de hoje de Rubens Nóbrega no Correio da Paraíba.


Rubens Nóbrega

Sábado, 26 de Setembro de 2009

Cícero, o ‘irretirável’

O professor Flávio Vieira, cientista político, criador do blog Pensamento Múltiplo, aposta que Cícero Lucena não vai sair do páreo. Pode até sair tostado da frigideira em que Cássio o colocou, mas não deve abrir ‘nem p’rum trem’.

Refere-se às articulações do ex-governador para retirar a candidatura do senador do PSDB em favor da unidade das oposições – leia-se, Ricardo Coutinho (PSB) – para encarar e vencer o governador José Maranhão (PMDB) nas eleições de 2010.

A análise do Doutor Flávio (no caso dele, o título é duplamente merecido – por ser acadêmico e pela competência do titulado) é mais uma imperdível e irrecusável colaboração que a coluna acolhe e partilha a seguir com os leitores possíveis.

Essa lengalenga interminável sobre se Cícero Lucena será candidato em 2010 só tem dois motivos: levar ao extremo do isolamento o senador do PSDB e, por fim, criar as condições políticas, que não estavam plenamente maduras quando o ex-governador chegou dos Estados Unidos, para Cássio Cunha Lima sair do PSDB.

Para mim, a candidatura de Cícero é “irretirável” e ele só não será candidato, primeiro, se não aguentar essa que é uma das mais longas e impiedosas frituras a que um político foi submetido. O senador está aguentando todo tipo de ações abertas de desmoralização pública e desconsideração orquestrada por alguém que, até um ano atrás, era um companheiro inseparável e cuja lealdade política ninguém colocava em dúvida.

E Lucena deve ser um sortudo mesmo, porque Cássio Cunha Lima o considera um irmão, imagine se ele o considerasse um primo, ou apenas um amigo. Ou um inimigo. Talvez o problema de Cícero seja esse: não ser “irmão” de verdade, pois se assim fosse, não só estariam - políticos e jornalistas cassistas - em campanha, mas exercitando o que a maioria deles faz de melhor, a bajulação.

Em segundo lugar, Cícero não seria candidato se Ricardo Coutinho concordasse em apoiar a candidatura presidencial do PSDB, nesse momento, José Serra. Nesse caso, as coisas mudariam de figura e, com a possibilidade de um candidato a governador competitivo apoiando Serra, o que o PSDB não tem em nenhum Estado nordestino, Cícero perderia o único suporte que sustenta sua candidatura. Como Ricardo Coutinho não fará isso (ao que parece hoje, não por conta de qualquer preocupação ideológica, mas pela força que Lula e sua candidata Dilma Roussef terão no Nordeste), Lucena continuará a ter o único apoio que ele precisa para ser candidato. E ponto final.

Nessa história toda, conclui-se que Cássio Cunha Lima só é “venha nós”; ao “Vosso Reino”, nada. O que vem a ser um outro bordão da política retirado das orações católicas, como o foi a Oração de São Francisco. Como Cícero Lucena não aceita retirar a candidatura para apoiar um adversário – “Era só o que faltava!”, deve pensar o senador com seus botões – e como nada é oferecido ao PSDB nacional, a não ser votar num candidato que apoiará lulistas para presidente – “Que menino egoísta esse tal de Cássio!”, deve comentar José Serra com Aécio Neves – o ex-governador pode ir tirando o cavalinho da chuva: Cícero é candidatíssimo.

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