sexta-feira, 7 de maio de 2010

Os profissionais


Eu ia escrever aqui sobre a Carta Aberta aos Paraibanos, que o Senador Cícero Lucena, do PSDB, leu ontem – a mando de Cássio Cunha Lima – na tribuna do Senado. Mas, eu só vou acrescentar o que se segue para depois lermos aqui o magistral texto que Rubens Nóbrega escreveu e transformou em sua coluna de hoje no Correio da Paraíba.

A referida carta caberia muito bem na sessão de obituário político dos jornais, se existisse. Quando a li foi impossível não lembrar Crônica de uma morte anunciada, de Gabriel Garcia Marques. É como se a carta compusesse, ao invés do primeiro, como acontece na obra-prima do escritor colombiano, o que seria o último capítulo de uma narrativa fúnebre e trágica. Ontem, quando renunciava, Cícero Lucena anunciava também a sua morte política. Resignado, ele se afasta, “levando nas mãos o cacho de suas entranhas”.

Até na hora de morrer politicamente, Cícero Lucena foi incapaz de rebelar-se. A carta é um libelo à resignação, e nem os bois ele foi capaz de nominar. Nas hostes da tucanagem paraibana, traição não tem nome, e deve ser engolida em seco. Com a serenidade daqueles que conseguem sempre impor suas vontades, Cássio Cunha Lima, por outro lado, ainda tripudiou chamando as palavras de seu companheiro de partido de “serenas e sensatas”, como se ele nada tivesse a ver com elas, o que foi uma outra maneira de dizer: ponha-se no seu lugar!

Confesso que o único sentimento que me despertou esse discurso foi o de pena.

Abaixo, Rubens Nóbrega, no auge da forma.

OS PROFISSIONAIS

O senador Cícero Lucena não precisava mesmo citar o nome de Cássio Cunha Lima na sua ‘Carta aberta aos paraibanos’, lida ontem da tribuna do Senado, para mostrar quem lhe inviabilizou legítima candidatura ao Governo do Estado.

Usando os próprios termos da carta-renúncia, dá pra ver que o senador descreveu com exatidão o quanto ‘profissionais’ como Cássio e os cassistas têm amizade e lealdade na conta de ‘valores descartáveis’ e que política não é para ‘amadores’ como Cícero e os ciceristas.

Eis porque na hora do vamos ver, no momento em que os amadores esperavam reciprocidade, os profissionais não deram à mínima “para toda uma trajetória política” pautada “pela correção e lealdade”, por renúncias e “desprendimento pessoal em favor da causa”.

A propósito, a que causa o senhor se refere, senador?

Seria por acaso a causa do patrimonialismo mais desbragado que a Paraíba já viu uma oligarquia praticar no governo? Ou a causa da instrumentalização mais escrachada do poder público em favor dos interesses particulares, credenciais mais notórias e notadas do grupo a que o senhor serviu com tanto fervor para, no final, levar esse monumental pé nos descarnados glúteos de Vossa Excelência?

Vamos a outro ponto de sua carta. O senhor pergunta: “Teria cometido erro ao confiar na sinceridade de propósito de alguns amigos e correligionários? Ou quando acatei tão determinada orientação para trabalhar e viabilizar uma candidatura?”.

Olha, senador, em se tratando de “alguns amigos e correligionários” seus, pode ter certeza de que a sinceridade se ofende por se ver associada a esses caras.

Quanto à “orientação” para trabalhar e viabilizar candidatura, lembro muito bem que ela foi dada no final do ano passado, pelo Doutor Cássio, ao senhor e ao senador Efraim Morais. Não foi?
Pois bem, o senhor saiu por aí, visitando as ‘bases’, assuntando correligionários, arrematando galeto em quermesse, carregando andor em procissão e até arriscando a vida em pouso forçado de helicóptero no meio das brenhas.

Enquanto isso... Enquanto isso, o Doutor Efraim, que já devia estar de combinação com o outro lá, tirava o time antes mesmo de entrar em campo e caia nos braços do Mago. Refiro-me ao ex Ricardo Coutinho, lógico.

Desde ali, vendo que tudo não passava de armação, conversa fiada do seu mui amigo Cássio, o senhor deveria ter ido à luta com mais gosto, com mais garra, falando grosso como presidente do partido, botando ordem no ninho, repelindo com vigor todas as tucanagens cassistas.

Aposto como os ciceristas origem esperavam algo assim, um gesto de atitude, uma disposição de brigar por sua vez, que já foi uma vez e o senhor deixou passar em favor do mesmo Cássio que agora lhe puxa o tapete pela segunda ou terceira vez.

Mas, não. Em vez disso, o senhor bateu em retirada, encolheu-se, desapareceu do mapa, foi viajar pelo exterior, tratar de seus empreendimentos, talvez, e deixou a conspiração cassista correr frouxa. Deu no que deu.

Aprendeu?
Pelo visto, sim. Tiro pelas frases de efeito de sua Carta, ao dimensionar o conceito que rege os atos e a postura de gente como o seu grande líder. Como é mesmo, senador? Quer dizer que com os profissionais o negócio é “amigos, amigos, política à parte? Lealdade, lealdade, política à parte? Correção, correção, política à parte?”.

Só não achei proporcional (dizer justo seria uma injustiça para com a justiça) o senhor ter dedicado apenas um paragrafozinho ao ex Ricardo Coutinho. Se entendi bem, foi na parte em que o senhor disse assim:

- Será erro grave questionar o que há por trás das aparências? Ou esta “opção” que se apresenta agora não é a mesma que até recentemente era governo, convenientemente situação, e hoje, pela mesma conveniência, se apresenta como oposição?

Com todo respeito, senador, creio que o seu redator cometeu um erro. Não cabe mais usar ‘aparências’ para se referir às posições políticas do ex-prefeito da Capital. O Doutor Ricardo é hoje uma grande e transparente certeza do que ele teria sido o tempo todo e tolos como eu só vieram perceber depois.

Por fim, mas não por último, felicito Vossa Excelência por ter, prudentemente, desrecomendado o voto em um ou outro candidato que sobrou no páreo verdadeiro da sucessão estadual do ano da graça de 2010.

De fato, ficaria muito feio anunciar apoio a qualquer um deles, principalmente José Maranhão (PMDB). Aí é que os cassistas iriam mesmo dizer que o senhor virou laranja do governador, que estava conluiado desde o início com o ‘inimigo’.

Mais duas coisinhas antes do ponto final. Não deixa de ser uma distinção o convite para que o senhor participe da campanha de José Serra à Presidência da República. E Vossa Excelência tem mais é quer dar tudo de si, feito jogador de futebol, pela candidatura do ex-governador paulista.
Já pensou se o homem ganha? O senhor certamente seria homem forte no novo governo tucano e poderia dar uma volta por cima daquelas, de roda gigante, passando por cima de tudo isso que estão lhe fazendo passar atualmente.

Só tem um pro: não deve acontecer. Como diria o saudoso Marcelo Rocha, ser presidente da República não está no horóscopo do Doutor Serra.

Pra encerrar, confesso que achei infeliz a escolha do verso de Quintana que abre a ‘Carta aos paraibanos’. Esse negócio de que “viver é acalentar sonhos” é papo de conformado , senador. Na minha ótica, na minha lógica, viver é realizar sonhos.

Um comentário:

  1. Christiano Almeida8 de maio de 2010 às 21:59

    Triste fim de Policarpo Quaresma, comido pelas formigas para não morrer de amor. Triste fim de Cícero Lucena, trucidado em via pública, não se dignou enquanto homos politicus, a estribuchar, pelo menos. Aqueles que leram "A arte da guerra", de Lao-Tsé, conhecem a forma como aquele senhor age. Vade retro!

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