sábado, 30 de outubro de 2010

Fazenda Cuiá: Leia a coluna de Rubens Nóbrega de hoje

Inindenizável, por Rubens Nóbrega

O mais grave no Caso Cuiá não é o preço acintosamente superfaturado da desapropriação, no valor total de R$ 10,7 milhões, de uma área que valeria no máximo R$ 2,3 milhões, conforme laudo de equipe de corretores credenciados pelo Conselho da categoria, o Creci.

O mais grave no Escândalo do Cuiá não é a velocidade supersônica com que o imóvel foi desapropriado e pago: o contrato assinado no dia 26 de agosto, os R$ 10,7 milhões empenhados no dia 31 daquele mês e o pagamento das duas parcelas nos dias 1º e 22 de setembro.

O mais grave no Negócio do Cuiá não é a estranhíssima (ou nem tanto assim) antecipação do pagamento da segunda parcela (no valor de R$ 5,396 milhões) do dia 1º deste mês (conforme previa o contrato) para o dia 22 de mês de setembro, como mostrei ontem.

O mais grave na Transação do Cuiá não é a avaliação de araque feita pela equipe de avaliadores da Secretaria de Planejamento da Prefeitura da Capital, que sequer foi ao local e muito provavelmente só conhece a área virtualmente, através de fotografias e mapas da Internet.

O mais grave na História do Cuiá é que foram subtraídos quase R$ 11 milhões dos cofres públicos para se pagar indenização por algo inindenizável, porque a área desapropriada é uma área de preservação permanente, na qual o proprietário e seu ninguém podem mexer.

O que a PMJP fez no Cuiá equivale ao governo federal desapropriar e pagar por um pedaço da Floresta Amazônica. Por essas e outras que envolvem o caso, espero que o Ministério Público vá à Justiça não só para desmanchar esse absurdo como para pedir o dinheiro de volta.

Tudo isso, claro, sem prejuízo de o MP ajuizar outras ações que responsabilizem penal e civilmente quem for encontrado em culpa nesse imbroglio que a cada dia expõe indícios cada vez mais fortes de envolvimento de agentes públicos em atos que favorecem flagrantemente interesses privados com o dinheiro do povo.

Fundamentação jurídica competente e qualificada é o que não falta. Basta seguir, por exemplo, os ensinamentos do ministro Antônio Herman V. Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), uma das maiores autoridades do mundo em Direito Ambiental, já citado pela coluna.

Sobre o assunto, encontrei na web belíssimo artigo do jurista intitulado 'Desapropriação, reserva florestal legal e áreas de preservação permanente'. Vale muito a pena ler com atenção o que ele diz na conclusão do seu trabalho, que transcrevo com o maior gosto após os asteriscos.

* * *

Em síntese parece-me que, diante dos argumentos acima expostos, as APPs (áreas de proteção permanente) e a Reserva Florestal Legal não são indenizáveis, nos termos do regime jurídico vigente no Brasil.

Inicialmente, não pode o proprietário acionar o Poder Público pleiteando indenização pelo fato de ter o uso e gozo de sua propriedade limitados pela só exigência de manutenção das APPs e Reserva Florestal Legal.

Tal vedação decorre não apenas do fato de terem sido ambas instituídas por lei de 1965 (prescrição), como ainda porque as duas, mesmo somadas, não inviabilizam o exercício do direito de propriedade no restante do imóvel.

Finalmente, no âmbito de desapropriação, direta ou indireta, da integralidade do bem, é descabido incluir na indenização a ser paga pelo imóvel o valor das APPs e da Reserva Florestal Legal, já que se caracterizam como limites internos ao direito de propriedade.

Conseqüentemente, o cálculo da indenização devida, ao ser reconhecida a desapropriação da totalidade do imóvel, deve descontar a área das APPs e da Reserva Florestal Legal.

Sobre o que ele escreve nos dois últimos parágrafos de sua 'Conclusão', dá para inferir o seguinte: mesmo que a PMJP tivesse desapropriado toda a antiga Fazenda Cuiá (que tem 135 hectares e há onze anos foi comprada a herdeiros por R$ 800 mil), do pagamento da indenização o governo mujnicipal teria que deduzir os 43 hectares que correspondem, justamente, à área de proteção permanente do imóvel.

Resumindo: a Prefeitura pagou, justa e precisamente, pelo que não precisava pagar, o que torna ainda mais escandaloso esse caso que a atual administração não explica, não esclarece e nada informa. Prefere, antes, tentar desqualificar a denúncia e os denunciantes, apesar da força dos fatos e das provas já divulgados.

Fechando, cabe lembrar que o ministro Herman Benjamin, para nosso orgulho e e maior satisfação, é paraibano de Catolé do Rocha e, mais do que fera em Direito Ambiental, é um ambientalista convicto, além de vice-presidente da Fundação Beradero, entidade da qual nosso talentoso Chico César é o presidente.

Como se fosse pouco, Benjamin foi Procurador de Justiça em São Paulo, onde coordenou o Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente do Estado, e professor de Direito Ambiental na University of Texas School of Law at Austin (EUA).

No Telaarana, mais uma da PMJP

O blog do jornalista e professor Derval Golzio (telaarana.blogspot.com) divulgou ontem "cópias dos documentos que comprovam outra irregularidade do então secretário de Planejamento, Luciano Agra, na gestão do socialista Ricardo Coutinho. Trata-se de liberação do loteamento Vale Verde, em Zona Especial de Preservação (ZEP), localizado no bairro de José Américo".

"Estes mesmos documentos já foram utilizados como referência para denúncia publicada pelo jornalista Rubens Nóbrega, em 27 de fevereiro deste ano. A Zep loteada fazia parte de um importante ecossistema responsável pela manutenção de mata ciliar do Riacho Laranjeiras, que separa parte dos bairros do José Américo e Mangabeira. Com o loteamento, a mata que protegia o riacho foi completamente devastada, o que poderá causar o seu assoreamento e até mesmo a sua extinção", adverte o blogueiro.

Visite o Telaarana, leia o texto do Professor Derval e dê uma checada nos documentos. É tão grave quanto o Cuiá, tenha certeza.


Para ir ao blog de Derval Golzio, clique aqui ou acesse através do link disponibilizado aí do lado direito entre os meus "blogs preferidos". Vale a pena.

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